Vivemos o paradoxo de desejar um amor desses de cinema e não querer empregar nossa energia na construção dessa relação.
Almejamos ter alguém com quem compartilhar nossas alegrias e angústias, mas não estamos dispostos a priorizar esse amor.
+220-145
muita paz
O que será que realmente buscamos e desejamos?
Me habituei a voltar à base sempre encontro paradoxos como o proposto...
Acredito que, muitas vezes, nós estamos dando nomes errados ou criando expectativas e estratégias de vida incompletas ou incoerentes porque nos posicionamos apenas a partir das dimensões conscientes, do ego, sem considerar as demais dimensões existenciais que definem a individualidade.
Penso que todos nós somos, existimos e atuamos na vida a partir de um universo múltiplo de expressões de humanidade que nos caracterizam como seres individualizados. Entretanto, buscamos abafar as dimensões não conscientes. Dizendo de outra forma, embora sejamos seres com dimensões ambientais, biológicas, culturais, históricas, ancestrais, individuais conscientes, individuais inconscientes e individuais espirituais; provavelmente nos reconhecemos apenas como seres na dimensão individual consciente, que atua no mundo tentando preponderar pela força e controlar e/ou anular as demais.
Algumas visões espirituais chamam esta atuação forte da dimensão individual consciente como egoísmo, uma forma de ver o mundo que deve ser revista para abrir aspectos de fraternidade e de solidariedade na sociedade. Muitas vezes associamos a ideia de paz à redução deste egoísmo, ou excesso de ego...
Penso que este seria, entretanto, um exercício humano e natural em sua essência, exercício através do qual temos amadurecido o entendimento sobre nós mesmos, sobre a vida em sociedade e sobre a integração à natureza e ao universo.
Questionar o que está por trás de nossos atos falhos, de nossas paixões, fruições e desejos seria, portanto, tarefa exigente e necessária se queremos realizar nosso movimento de crescimento e amadurecimento individual.
A partir dos estudos de psicanálise tenho refletido sobre a impossibilidade de existir enquanto ser considerando apenas a dimensão individual consciente. Nossos pensamentos, sentimentos, ações, discursos e omissões serão sempre a soma de todas as múltiplas dimensões existenciais e os conflitos ou dificuldades nasceriam sempre que tentamos estabelecer o controle de uma dimensão sobre as demais.
Haveria uma interação constante de todas as dimensões constitutivas do ser na definição de nossa existência, embora nem sempre consigamos pensar nossas expressões no mundo de forma consciente e, consequentemente, racional e intencional.
Quando olho para o paradoxo proposto, inevitavelmente começo a me perguntar onde estaria nascendo este desejo, que pode estar sendo racionalizado na dimensão consciente como o desejo por um amor de cinema, mas que pode representar outra necessidade existencial...
Quando almejamos alguém para compartilhar alegrias e angústias, estaríamos realmente precisando de alguém? Ou estaríamos dizendo que não damos conta daqueles momentos sozinhos? Talvez nossa necessidade seja apenas a de sermos reconhecidos pela grandiosidade do momento experimentado por nós.
Será que falamos de uma impressão cultural herdada que só considera plenitude existencial quando estamos em pares? Este desejo pode estar dizendo muito mais de nosso lamento quanto à incapacidade de atender a padrões sociais herdados do que da real necessidade de uma parceria relacional.
Buscamos realmente partilhar alegrias e angústias? Ou esta seria uma justificativa racional nascida em uma sociedade preconceituosa que nega a autenticidade da necessidade de uma parceria erótica?
Quando não priorizamos a construção deste amor, talvez estejamos declarando que este amor de cinema não é, em essência, uma necessidade. Talvez estejamos dizendo de outras necessidades como a de segurança, que se põe acima da necessidade do amor, mas que não conseguimos racionalizar e nem perceber com clareza...
Poderíamos seguir enumerando diversas explicações possíveis e, ainda assim, não poderíamos ser conclusivos sobre o assunto. O que vemos e significamos conscientemente pode ser apenas o sintoma de necessidades e carências definidas em outras dimensões de mim mesmo sobre as quais não tenho consciência.
Neste sentido, defendo a ideia de que este paradoxo só é realmente um problema a ser enfrentado, caso esteja trazendo angústia para o sujeito. Talvez vivamos estes paradoxos como caminhos possíveis e coerentes no momento para a individualidade que somos.
Outro fato me chamou a atenção na leitura. O uso da primeira pessoa do plural pode ser indicativo importante de identificação através da relação observador-observado. Talvez o outro viva este paradoxo sem angústia, mas eu não.
O desconforto que sentimos diante do aparente paradoxo vivido pelo outro talvez nos fale mais do observador do que do observado.
Se enxergo falta no outro, é porque reconheço esta falta. E, se a reconheço, é porque a conheço! Talvez eu ainda viva esta falta, mas não seja capaz de identificá-la em mim. Talvez eu só esteja declarando, como observador, que ainda não sou capaz de priorizar o atendimento ao que me falta. Seria esta a causa de minha angústia diante do paradoxo identificado no outro?
Por isso a pergunta desconfortável: O que será que realmente buscamos e desejamos?
O que será que realmente buscamos e desejamos?
Me habituei a voltar à base sempre encontro paradoxos como o proposto...
Acredito que, muitas vezes, nós estamos dando nomes errados ou criando expectativas e estratégias de vida incompletas ou incoerentes porque nos posicionamos apenas a partir das dimensões conscientes, do ego, sem considerar as demais dimensões existenciais que definem a individualidade.