Não há pessoas mais vazias do que aquelas que vivem cheias de si.
+085-281
muita paz
Assim que li o pensamento proposto, levei um susto com a afirmação e tendi a discordar, algo típico do meu pensamento inquieto que sempre procura outras alternativas. Depois de algumas respirações profundas de interiorização e releitura, tendi a concordar com a ideia, talvez motivado pelos reiterados movimentos de compreensão religiosa que me dizem da necessidade de sermos caridosos com o outro e da importância de abrandarmos nossas expressões egoicas.
Foi apenas, neste momento da releitura, no quarto ciclo de leitura e respiração profunda em busca do eco em mim sobre o texto proposto que consegui transcender o texto e me encontrar. O que o texto realmente dizia e quais eram as lentes que eu estava usando? Que camadas de entendimento e de conceitos prévios eu estava usando?
Me dei conta que a ideia de vazio me remeteu a um lugar desconfortável. O vazio seria algo bom ou ruim?
Lembrei de meu projeto de pesquisa sobre o amor, sobre a ideia de silêncio do universo proposta por Leon Dénis em sua magistral obra O Grande enigma, pensei nos buracos negros no espaço...
Fazendo então uma leitura subversiva ao senso comum proposto por diversos pensamentos religiosos inspirados em Jesus, atrevo-me a pensar que o vazio é bom e que buscamos viver cheios de nós mesmos. Mas acredito que seja importante discorrer um pouco sobre o que meu coração me contou a respeito...
Um sábio disse certa vez da importância de conhecermos a nós mesmos e os orientais adotam este caminho há vários séculos por meio de tradições que precedem a mensagem de Jesus que fundamentou o surgimento dos pensamentos cristãos no ocidente.
Segundo algumas crenças orientais como o budismo e o hinduísmo, nosso caminho de despertar espiritual, a transcendência proposta por alguns grandes religiosos, se configura quando conseguimos olhar para nós mesmos e irmos além do horizonte do ego.
Nesta linha de pensamento, o sujeito treina para reconhecer as delimitações do ego a fim de enxergar o que estaria além dele, que seria o espírito, identidade que preside não apenas o ego, mas também a chama sagrada do divino que está em nós, entre outras dimensões que variam de acordo com cada linha religiosa.
O ego funcionaria como um guardião habilidoso que procura manter intacta a ilusão vivida através da matéria, campo de experimentação, crescimento e despertamento do espírito. Ele seria uma etapa evolutiva necessária do espírito que, nas crenças reencarnacionistas, apresenta-se reiteradas vezes com roupagens diferentes em reincarnações que servem para o crescimento espiritual.
Hoje entendo que precisamos nos encher de nós mesmos para crescer. À medida que tornamos nossas expressões espirituais mais autênticas e singulares, compreendemos melhor o funcionamento do universo.
Entretanto, este processo de inflação do ego não nos traz apenas as dimensões materiais de nossa essência divina. Ele nos revela o outro, as relações necessárias que estabelecemos com tudo o que, assim como nós, existe. Ao nos enchermos de nós mesmos através da inflação do ego, percebemos melhor as fronteiras de nossa singularidade e as relações inevitáveis que se estabelecem nestas fronteiras.
Acredito que esta tensão talvez nos leve a questionar a necessidade da existência do ego enquanto entidade permanente. Me parece que, quanto mais cheios de nós mesmos, quanto mais afirmações fazemos ao ego, menos confortáveis nos sentimos. Acredito que nesta hora começamos a perceber uma voz interior, a chama sagrada do divino em nós, ou a assinatura de Deus, como gosto de nomear.
Quando dirigimos nosso olhar para a assinatura de Deus em nós, reverberamos com o universo em autêntica harmonia, sentimos plenitude, nos sentimos amados. Surge o entendimento da transitoriedade do ego enquanto construção temporária necessária para acessarmos conscientemente a assinatura de Deus em nós, o amor.
É neste ponto da reflexão que resgato um pensamento apresentado a mim pelo meu psicanalista.
E se este medo que sentimos do vazio estiver nos impedindo de acessar a nossa verdadeira essência? Talvez o vazio seja a nossa incapacidade de ver e de sentir Deus em nós.
Carrego esta provocação na mente e no coração há algum tempo. Acho que nosso ego não tem capacidade de ver algo que não se define na materialidade, o sagrado que existe em nós, para além do ego, e que expressa o amor puro e incondicional sob diversas formas de expressão amorosa, tais como justiça, misericórdia e necessidade de autopreservação.
Por isso atrevo-me a pensar que o vazio é bom e que buscamos viver cheios de nós mesmos, mas reconheço que nos encheremos do sagrado em nós e não de ego.
Em algum momento de nossa jornada rumo à plenitude e à felicidade, acolheremos as fronteiras de nossa singularidade e as relações estabelecidas com outras singularidades como elementos essenciais para nos sentirmos plenos, uma vez que a assinatura de Deus em nós exige que coloquemos o amor recebido do criador em movimento através do ato de amar, algo que só pode ser feito pela redução da importância do ego na composição de nossa percepção sobre nós mesmos.
Assim que li o pensamento proposto, levei um susto com a afirmação e tendi a discordar, algo típico do meu pensamento inquieto que sempre procura outras alternativas. Depois de algumas respirações profundas de interiorização e releitura, tendi a concordar com a ideia, talvez motivado pelos reiterados movimentos de compreensão religiosa que me dizem da necessidade de sermos caridosos com o outro e da importância de abrandarmos nossas expressões egoicas.